PF dar um tapa na transposição e alerta que ela pode estimula plantio de maconha e trabalho escravo na Paraíba
Levantamento
da Polícia Federal revela que 10% da maconha consumida no Brasil têm como
origem plantios nos estados da Paraíba, Maranhão, Amazonas e Pará. A PF ainda
estima que pelo menos 15 municípios entre o nordeste da Bahia e o centro de
Pernambuco têm plantações da erva, no ‘Polígono da Maconha’.
Desses
estados um tem chamado a atenção da Polícia Federal. A Paraíba, por ser estado
vizinho de Pernambuco e receber um dos eixos da transposição do São Francisco,
tem atraído investimentos do tráfico. Pela zona rural do município de Monteiro
(a 265 km da capital João Pessoa, na região do Cariri paraibano), desembocarão,
por meio do eixo leste do canal construído pelo Governo Federal, as águas no
rio Paraíba.
A
estiagem, que desestimula as culturas lícitas, absorve plantações da maconha em
áreas pertos de rios, em terras sem dono e com garantia de água. A transposição
do Rio São Francisco, que levará água onde ela é escassa, preocupa a Polícia
Civil Paraíba e a Polícia Federal. “Alertamos autoridades para o risco de
plantios onde hoje não existe”, diz Cristiano de Oliveira Rocha, delegado
federal de Salgueiro, cidade de Pernambuco na zona do cultivo.
Nas
operações na região do Cariri, a Polícia Federal, com base em Pernambuco,
acompanha de perto o trabalho da Polícia Civil da Paraíba. “Na primeira incursão,
em 30 de outubro de 2013, fomos recebidos a tiros numa fazenda. Voltamos dez
dias depois e achamos 2,2 toneladas de maconha”, diz Yuri Givago, delegado do
Grupo Tático Especial da Polícia Civil paraibano, que investiga o trabalho
escravo na fazenda e conexão com traficantes da região do Polígono.
Ao
todo, 127 cidades da Paraíba devem ser beneficiadas pelo canal da transposição
do São Francisco, apenas pelo eixo leste, via Monteiro, que faz divisa, a
Oeste, com os municípios pernambucanos de Sertânia, Iguaraci e Tuparetama.
O
estado ainda receberá o canal do eixo norte, por São José de Piranhas (no Alto
Sertão, a 503 quilômetros da Capital), que vai beneficiar 55 cidades. O governo
também promete a construção de um novo canal de entrada, numa adutora que liga
o eixo norte até o açude de Condado, no município de Conceição (no Vale do
Piancó, a 482 quilômetros da Capital).
Renda - Na matemática do
tráfico, cada três pés da planta rendem, em média, 1 kg de maconha. Os
traficantes pagam até R$ 200 por quilo aos plantadores, diz Rocha, delegado
federal de Salgueiro. Nas capitais nordestinas, o quilo da droga alcança de R$
500 a R$ 700. “Se o volume dizimado tivesse sido vendido a R$ 500, o quilo, R$
3,8 bilhões teriam sido injetados na cadeia do tráfico”, calcula Rocha.
Givago
descobriu que os donos da terra no município paraibano de Monteiro são de fora
do estado. “Vou precisar do apoio e da experiência dos policiais do Polígono
para combater o cultivo aqui”, diz o delegado.
Em
2013, as operações de erradicação evitaram que 300 toneladas da droga
abastecessem o mercado, quantidade bem acima das 220,7 toneladas apreendidas
pela PF em todo o país no período. Mas os números vêm caindo. Apenas 10% da
produção é em território nacional. “O Paraguai, maior produtor da América do
Sul, fornece os outros 90%”, diz o chefe da Divisão de Operações de Repressão a
Drogas da PF, Cassius Valentin Baldelli.
Em
16 anos, foram feitas mais de 50 operações de erradicação no Polígono da
Maconha. A PF calcula que 23 milhões de pés foram destruídos, evitando que
7.600 t da droga chegassem aos usuários.
O
Polígono da Maconha tem inúmeros lados. “De 2008 a 2010, quase 6 milhões de pés
de maconha foram destruídos no sertão. Já entre 2011 e 2013, foram 2,5
milhões”, compara Baldelli. “A redução mostra que as operações periódicas têm
sido eficazes.”
O
plantio no Polígono da Maconha começou na década de 1970 e se intensificou entre
1990 e 2000. O delegado de Salgueiro cita que o cultivo foi facilitado pelo uso
das margens do Rio São Francisco.
Pagamentos - As delegacias de
Salgueiro e Juazeiro (BA), únicas da PF dentro do Polígono, identificaram que
criminosos estavam pagando agricultores e moradores desempregados da região
para cuidar das roças. “Até meados dos anos 2000, houve muita violência, pois
as quadrilhas usavam o lucro do tráfico para comprar armas e promover assaltos
a banco da região”, recorda o delegado.
A
partir de 2005, houve um declínio na quantidade de pés destruídos pela PF, o
que foi associado à desarticulação de quadrilhas. Segundo Rocha, muitos
criminosos que faziam a ponte entre os plantadores e os traficantes migraram
para outros estados ou morreram em confrontos com policiais.
Alguns
moradores do Polígono, no entanto, continuaram plantando e passaram a vender
diretamente aos traficantes, esclarece o delegado da PF.
Os
policiais descobriram que as roças estão mais distantes das margens, o que
dificulta a erradicação. Rocha também descobriu que plantadores perfuram
adutoras em meio ao sertão para ter água.
Para
escapar do cerco policial, traficantes acabam arrancando os pés de maconha
antes de conseguirem maior concentração da substância psicoativa THC. Isso
torna a qualidade da erva da região menos apreciada, diz Rocha.
Esse
hábito, aliado à menor oferta local, abriu mercado para a maconha paraguaia,
segundo a PF. Em 2013, a PF apurou que 1,8 t das 2,5 t de maconha apreendidas
em Pernambuco foram trazidas do país sul-americano.
O
cerco policial no Polígono da Maconha levou traficantes a ampliarem a zona de
plantio, afirma Marco Antonio Valle Agostini, perito da Unidade
Técnico-Científica da PF em Juazeiro.
Em
janeiro, 350 pés (116 kg) foram destruídos em Barreiras, cidade baiana a 577 km
de Juazeiro. “Agora precisamos cobrir maiores extensões, o que eleva os custos
e o tempo das operações”, diz Agostini.
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