Pela primeira vez a ONU sugere a descriminalização do consumo de drogas e põe mais fumaça nesta discussão.
A
ONU admite em um documento elaborado para uma reunião na próxima semana em
Viena que os objetivos na luta mundial contra as drogas não foram cumpridos até
agora e sugere pela primeira vez a descriminalização do consumo de
entorpecentes.
'A
descriminalização do consumo de drogas pode ser uma forma eficaz de
'descongestionar' as prisões, redistribuir recursos para atribuí-los ao tratamento
e facilitar a reabilitação', afirma um relatório de 22 páginas do Escritório
das Nações Unidas contra a Droga e o Crime (UNODC), ao qual a Agência Efe teve
acesso.
A
UNODC não quis fazer comentários à Efe sobre o conteúdo do documento, mas
várias fontes diplomáticas especializadas em política de drogas concordaram que
é a primeira vez que o organismo menciona a descriminalização de forma aberta.
A
descriminalização do consumo pessoal, já aplicado em alguns casos no Brasil e
vários países do mundo, supõe que o uso de drogas seja passível de sanções
alternativas ao encarceramento, como multas ou tratamentos.
No
caso específico Uruguai, foi legalizada a compra e venda e o cultivo de
maconha, e estabelecida a criação de um ente estatal regulador da droga. Em
qualquer caso, a descriminalização não representa uma legalização nem o acesso
liberado à droga, que segundo os tratados só pode ser usada para fins médicos e
científicos, mas não recreativos.
Portanto,
segundo a ONU, o consumo seguiria sendo sancionável (com multas ou tratamentos
obrigatórios), mas deixaria de ser um delito penal. A UNODC assegura no
relatório que 'os tratados encorajam o recurso a alternativas à prisão' e
ressalta que se deve considerar os consumidores de entorpecentes como
'pacientes em tratamento' e não como 'delinquentes'.
Na
próxima quinta-feira (13/03) em Viena, a comunidade internacional avaliará na
Comissão de Entorpecentes da ONU a situação do problema das drogas e se foram
cumpridos os objetivos pactuados em 2009 em um roteiro para uma década, quando
em 2014 já se percorreu a metade do caminho.
Em
2009, os Estados da Comissão adotaram uma Declaração Política que previa que se
'elimine ou reduza consideravelmente' a oferta e a demanda de drogas até o ano
2019, um ambicioso objetivo que por enquanto está longe de ser cumprido.
Para
o debate deste ano, a UNODC elaborou este relatório, assinado por seu diretor
executivo, o russo Yury Fedotov, no qual avalia a situação atual da luta contra
as drogas. O relatório aponta progressos 'desiguais', mas reconhece que 'a
magnitude geral da demanda de drogas não mudou substancialmente em nível
mundial', o que contrasta com os objetivos fixados em 2009.
Apesar
de a UNODC ressaltar que o mercado da cocaína e o da cannabis se reduziram,
reconhece que o aumento dos estimulantes sintéticos, mais difíceis de detectar,
e a recente aparição de centenas de novos entorpecentes de última geração
enfraquecem esses avanços. A prevalência mundial do consumo de drogas continua
assim 'estável' em torno de 5% da população adulta, e as mortes anuais causadas
por seu consumo se situam em 210 mil pessoas.
A
UNODC admite as dificuldades para precisar as tendências globais das drogas
pela carência de dados fidedignos sobre o narcotráfico, o dinheiro lavado dos
entorpecentes e a fabricação de substâncias sintéticas, entre outros aspectos.
A queda do consumo de drogas nos países ricos se viu compensada com um aumento
nos países em desenvolvimento, que não estão tão preparados nem têm recursos
suficientes, lamenta a UNODC.
Também
se indica que 'o tráfico de drogas desencadeou uma onda de violência' na
América Latina e que em 'alguns países da América Central se registraram os
índices de homicídio mais elevados do mundo, frequentemente com números de
mortos superiores aos de alguns países afetados por conflitos armados'. Em
seguida, se destaca que alguns líderes latino-americanos chamaram atenção para
os enormes recursos que movimentam os narcotraficantes e solicitaram, segundo a
UNODC, que 'se examinem os enfoques atuais do problema mundial da droga'.
O
relatório assinala que 'é importante reafirmar o espírito original dos
tratados, que se centra na saúde. O propósito dos tratados não é travar uma
'guerra contra as drogas', mas proteger a 'saúde física e moral da
humanidade''. O documento insiste que a legislação internacional sobre drogas é
flexível o bastante para aplicar outras políticas, mais centradas na saúde
pública e menos na repressão.
No
entanto, a UNODC adverte que menosprezar as leis internacionais contra as
drogas piorará a situação, já que 'um acesso não controlado às drogas' ajuda 'o
risco de um aumento considerável do consumo nocivo de entorpecentes'. Além
disso, salienta a importância da prevenção e do tratamento, e ressalta que os
direitos humanos devem ser respeitados sempre na hora de combater as drogas e
critica a aplicação da pena de morte por delitos de tráfico ou consumo de
entorpecentes.
Fonte: G1-Mundo
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